sábado, 30 de maio de 2015

Já se passaram meses e até anos, eu to viva sim senhor!

O que cai na rede, fica na rede certo? Certo!
Fazendo um trabalho pra faculdade sem querer entre no meu login e lembre desse diário. Confesso quer ler tudo isso me fez sair do meu próprio personagem. Que garota é essa meu Deus? Será a que Anna 22 anos estudando e na labuta pós câncer e agora cacheada conseguiria passar por tudo isso? Senhores, ainda continuo medrosa e seria a própria representante de Deus na terra se lhes dissesse que sim, passaria e que superei o fato. Ainda tenho medo, e como tenho.
Desde meu ultimo post, quase 3 anos depois, eu ainda lido com isso todos os dias quando tiro minha roupa para tomar um banho e vejo minha cicatriz, quando meu cachorro espaçoso insiste em bater a pata no meu protocart, quando me perguntam por que não vou fazer um intercambio ou sair do país e tenho que lembrar da minha injeção mensal de anticoagulante.
O meu cabelo amigos, cresceu, sabe como? Enrolados como cachos de uva, como molas de carro, como macarrão de parafuso. Tenho que hidratar, puxar e enrolar todos os dias. Essa é parte do que deu bom, é a parte do certo por linhas tortas. Então além de nariz chato agora você é cacheada? Sim! Qualquer traço que justifica meu sobrenome estranho de samurai se foi.
Vou voltar a escrever, dessa vez sem delongas, uma vez por semana, deixo minha promessa assinada aqui. Mas a saber estou vivíssima, estudado e realizada.

terça-feira, 2 de outubro de 2012

28/08/2012 - Ciclo 1 - Segunda tentativa.

Depois de uma tentativa frustrada por conta da amigdalite vamos recomeçar o ciclo, assim , do zero! O meu protocolo não foi alterado, 3 dias com intervalos de 21 dias. Explicando melhor, eu fico indo e vindo durante 3 dias no hospital para no quarto e último dia ir só pra retirar a BIC, a quimioterapia que faço em casa.
O primeiro dia tomo 3 drogas diferentes, uma delas me deixa com uma certa tremedeira, a mesma sensação de quando paramos de andar em uma esteira elétrica e descemos dela logo em seguida, o efeito prolongado disso não é nada agradável. Além disso tem a terrível QT Vermelha, essa sim tem todo meu rancor, é ela a responsável por grande parte do meu mal estar. O paladar, as dores, o cabelo, enfim...
Lembro que durante todo ciclo uma tosse de cachorro me fez companhia, principalmente de noite, tomei todos os xaropes de vó que vi pela casa, mas fiquei só na tosse, nada de febre!Alivio.
Os dias de QT foram todos muito cansativos e tive todas reações previamente discutidas com a minha oncologista.
A começar com a náusea, lembro que na segunda noite passei parte dela consternada ao vazo sanitário, nada parava no estomago! Sentia um cansaço sem igual, como se tivesse passado o dia andando ou fazendo alguma atividade, sendo que não.
Meu paladar foi brutalmente destruído, o desespero de fazer alguma coisa para melhorar aquele gosto de cabo de guarda-chuva, sabão, pia, enfim, muitos nomes para o mesmo sabor, até cebola eu cheirei, e advinha ? Aliviou a repulsa. Já adianto que não existe qualquer logica nesses eventos.
Dor de velha, isso mesmo, nas juntas, terríveis. A vontade é bater os joelhos em algum lugar, de quebrar pra vê se alivia. Minha cabeça ficou com varias feridas por conta dos corticóides que tomo em anexo a qt, são erupções que incomodam muito quando em fricção com o travesseiro, toalha ...
Fui obrigada a substituir alguns utensílios por conta do paladar, durante algumas refeições fiz uso de talheres de plástico e não de metal, troquei também a pasta de dente, as comuns me dão muita náusea, faço uso de uma que não tem gosto, mas ainda sim o aspecto pastoso é bem desconfortável ás minhas papilas.
Assim foi o primeiro round, todas as manifestações possíveis e uma vitória.
Fiquei contente ao ver que no final de uma semana de muitos incômodos e mal estar eu estava bem e que minha preocupação já era voltada para frente, o segundo ciclo.

sexta-feira, 28 de setembro de 2012

Nota de desculpas!

Acho que estou começando a me arrepender de ter me exposto tanto, alias, expor não, mas tentar ao mesmo tempo gerenciar todas essas novas dores e situações e traduzir em capítulos pensados . Cá entre nós, não sou muito boa com as palavras, digo, não com a gramatica. Não sei ficar fazendo digressões e nem gosto, só os ébrios que andam e param. E por sinal, eu ando muito é sóbria de realidade e perdi a pressa no tempo.
Sinceramente não sei nem por onde começar a voltar a escrever, desde do último capitulo muito coisa se passou, e quer saber qual foi a pior delas? O cabelo. Sim! Voltamos nessa tecla, mas agora com a propriedade de quem passou pelo pesadelo e se viu desintegrando, se transformando. Nada mais dolorido que se olhar no espelho e não se reconhecer.
Mas antes disso vou contar como foi oficialmente a primeira quimioterapia...



quinta-feira, 9 de agosto de 2012

Quimio cancelada !!!

Dia 02 do ciclo 1, corro para o hospital para passar no pronto socorro antes que a bomba chegasse no fim. Explico a situação para a enfermeira da triagem que me coloca na frente dos demais pacientes. Vou para sala de espera e a danada da bomba chega ao fim, começou a disparar no meio de todo mundo, sorte que não é preciso nenhum curso técnico para desarmar aquilo.
Passo com a medica que vendo a urgência do caso me coloca como prioridade da prioridade. Suspeita de amigdalite, fui encaminhada para mediação para aliviar um pouco a dor e fiz exame de sangue. Dentro de duas horas ele ficaria pronto. 
Sai do PA e fui para o oitavo andar, tudo atrasado, Não só a minha bomba havia acabado como também de outros pacientes, para piorar a equipe da UIQT estava em reunião, no dia anterior aconteceu alguma coisa, geral levando bronca.
Primeira noticia boa, o remédio fez efeito, minha garganta voltou ao normal, quase ao normal. Como estava esperando para entrar mamãe aproveito para buscar algo pra eu beliscar e me deixou na companhia de um anjo. 
Entrei pro box e contei as enfermeiras da noite anterior, só pelo fato de eu ter tido febre já fico avisado que provavelmente eu teria que parar a quimio, tudo dependeria do exame de sangue que eu fiz mais cedo. Caso  desse amigdalite bacteriana teria mesmo que parar o tratamento. 
Bingo! Sai o exame e claro não poderia ser diferente. Era mesmo bacteriana, a propriá medica do PA entrou em contato com a minha oncologista e ficou acordado que voltaria em 15 dias para ver quando vamos reiniciar o tratamento. 
Saldo ? Terrivelmente desolada e chateada com a vida.
Desde quando esse pesadelo começou nada foi fácil, todas as vezes aconteceu alguma coisinha que impedisse ou que fizesse as coisas adiarem. 
Não que esteja desistindo, mas cansada a ponto de me trancar. Receio perder a fé, de ficar fraca a ponto de quando for fazer isso de novo eu não me sentir tão segura como estava. Mais uma vez o fantasma do pensamento positivo volta a me afrontar. 
É complicado mandar um sorriso no rosto quando tudo te leva a chorar. Quando a vida consegue se fazer mais injusta do que tem sido, nao que exista qualquer tipo de justiça nisso, mas está me beirando a crueldade, de uma certa forma.
Com isso minha alta que estava programa para janeiro, pode avançar um ou mais meses, isso é, se mais nada der errado daqui pra frente... 
Tudo que eu queria é ficar bem, passar por isso logo, será que é pedir muito ?
Queria ser digna de tamanha benção. 
Paciência, é o que me resta, como se eu já não tivesse tido o suficiente... 

Ciclo 1 - dia 01

Dia 07/08/2012, finalmente comecei a tal quimioterapia. 
O primeiro dia foi tranquilo, já estava com uma pequena irritação na garganta mas nada sério. Cheguei na clinica por volta das sete da manha, até preparar tudo e eu receber todas as orientação foi quase uma hora, as oito chegou a primeira mediação. 
A quimioterapia, por ser uma farmácia agressiva é preciso deixar os rins preparados para tal. Primeiro, soro com uma medicação especifica para o estomago, depois outra dose de soro com solução alcalina de potássio e magnésio para os rins e para não disparar o coração. 
Feita toda essa preparação vem o primeiro quimioterápico. Ao todo vou fazer uso de 4 drogas diferentes, uma delas apenas no primeiro dia, uma outra chama de quimio vermelha que levo pra casa e outras duas que tomo por 3 dias no próprio hospital. 
Com esse tanto de soro perdi as contas das tantas vezes que fui ao banheiro. A primeira droga não me surgiu nenhum efeito imediato. Já a segunda... isso é, depois de mais soro alcalino para deixar os ruins em bom estado. Tive uma queda de pressão e uma leve aceleração cardíaca. O suficiente para outra dose de soro pra me deixar melhor hidratada. 
Ao final disso tudo, passei quase 10 horas nos hospital tomando medicação, estava exausta, como queria chegar em casa para descansar.
O oitavo andar mais me parecia uma feira. Gente entrando e saindo o tempo todo. Sem contar as bombas apitando a todo momento, os carrinhos com medicação, as companhias nos boxes solicitando as enfermeiras e por ai vai. Impossível relaxar, só que isso não é nada até sair um gol do Brasil. Pronto, o circo estava armado. Mas que seja assim, melhor. Lugares serenos me deixam deprimida. 
A volta pra casa foi mais uma vez intensamente desejada. Mas antes disso vamos instalar o meu novo companheiro, uma bomba quimioterápica. Durante 20horas vou ficar tomando a terceira quimio via cateter, a bomba ficava pendurada em mim por uma bolsinha e apitava toda vez que a dose da quimio fosse liberada. Desconfortável, mas ainda sim melhor que qualquer leito de hospital. A medicina é incrível. Quimio terapia portátil, viva aos tempos modernos.
Passado a hora da janta e nada de eu conseguir comer, uma baquete digno feito especialmente pra mim e nada de eu forçar aquilo goela a baixo. Minha garganta tinha piorado, alias, ela fechou de vez.
A essa hora eu já estava sentindo os primeiros efeitos da mediação, um gosto terrível de sabão na boca. Até  cravo chupei para mascarar aquele gosto e tentar jantar alguma coisinha, mas não deu certo. 
Mais uma vez a exaustão falou mais alto... estava péssima até mesmo para esperar um sopa ou me atracar com um miojão. Me contive com um chá e meu complexo B. 
Primeira noite de sono, três da manha. Papaiii ... não aguentei, minha garganta estava péssima, qualquer remédio que ajudasse eu mandaria pra dentro. Nem mesmo saliva estava engolindo. Que coisa terrível... 
3 da manhã chamei de novo por ele, dessa vez com frio. Muito frio .. estava com febre. 
Mais um remédio pra aliviar um pouco e tirei uma pestana. 
Quase 5, de novo chamo por ele, dessa vez mamãe se oferece para dormir comigo, colo de mãe sempre é um santo remédio, mesmo assim nada.
Quase amanhecendo meu estomago deu sinal de que algo não estava legal. Corre pro banheiro e externizo minha vida. Tudo que tinha comido no dia se foi. Meu estomago esvaziou a ponto de doer.
Volto pra cama, outra pestana e mais corridas ao banheiro. 
Assim foi a noite, pela manhã tirei cochilos mais longos, mas com a garganta em chamas. Nem mesmo agua descia, tomar as sagradas oito pírulas matinais foi quase um tormento. 
Levanto, tomo outro banho torto e corro pro hospital... segundo dia de quimio ai vamos nos.




quinta-feira, 2 de agosto de 2012

Um jeito de ajudar...

Eu já estava a muito tempo querendo postar alguma coisa sobre como conduzir quando você tem um amigo ou parente que estar com CA. Nesse meu período de isolamento por conta da doença senti que tem gente que se afasta de você não por não se importar ou coisa do tipo, mas por simplesmente não saber como agir diante desta situação. 
Sinuca de bico, é assim que ficamos. Há uma cobrança social que te faz pensar que precisa ajudar, manisfestar solidariedade, dar apoio... Mas não acho que seja esse o caminho, uma obrigação! Por exemplo, tem coisa de definitivamente não devem ser ditas. Não ajuda em nada e faz mal! 
-"Aquela doença"
-"A cura está na cabeça"
-"Conheço alguém que teve câncer e blablabla..."
-"Os efeitos colaterais são "o de menos" 
-"Você não pode ficar triste, pensamentos positivo sempre"
-"Cabelo nasce de novo"
-"Imagino como você esta se sentindo" 
E por ai vai ... Claro que isso tudo é verdade, mas não é um coisa que nutre, isso não serve de combustível pra nada. Quando se esta deste lado da doença qualquer coisa é exponencial, é preciso ter muito cuidado com o nosso psicológico, ele está a beirando o holocausto.  
Agora algumas coisas são maravilhosas de se ouvir, de se sentir... 
-"Como posso te ajudar?"
-"Tenho te colocado em minhas orações"
-"A medicina evolui a cada dia" 
-"Só liguei pra dizer que to pensando em você"
-"Ficar careca é ruim sim, vamos comprar um monte de lenço pra você" 
-"Eu te amo"
-"Vamos passar por isso juntos..."
-"Trouxe chocolate pra você!"
Se você for de Rio Claro;
-"Sakura, fica boa logo pra gente ir pro Inter"
Se você já encheu a cara comigo:
-"Anna, quando você melhorar vamos tomar todas"
Se você for um querido/querida;
-"To lendo seu blog!" (hahahaha...é serio.)
Ou então me oferece um pastel que tá tudo certo. 
Bom, espero que isso ajude! O mais importante é ter leveza na alma e fazer isso com muito carinho. Se tem uma coisa que passa e que ajuda muito é energia. Um sorriso pode fazer toda diferença... 


quarta-feira, 1 de agosto de 2012

Pré-quimio.

Já estou a uma semana de começar a QT, pra não perder muito dos bastidores dessa última fase do tratamento, vou revezar entre capítulos da historia e a quimio.
27/08/2012 - Ultima consulta com a oncologista antes de dar inicio ao tratamento. Recebi incontáveis recomendações e uma lista de remédios que devo tomar junto com a quimio. 
Além da medicação quimioterapica vou tomar corticóides, segundo minha medica, há literatura quanto a ação de corticóides na redução de alguns tumores, potencializando a ação da quimioterapia.
Além deste, vou tomar 3 remédios para o estômago. Meu protocolo costuma causar muita nauseá no paciente. Pode ser que eu venha ter diarreia e afta, medicação pra isso também. 
Quanto aos efeitos colaterais, não posso afirmar com certeza, isso muda com o metabolismo de cada um, mas alguns sintomas já são esperados; queda de cabelo e pelos, escurecimento das unhas, manchas na pele por conta de ressecamento da mesma, anemia, menopausa temporária, inchaço ou perca de peso, alteração no paladar, perda de apetite e por ai vai... 
Ainda essa semana passo com minha psicologa, to tentando encontrar  um ponto de equilíbrio pra não deixar que minha ansiedade tome conta e acabe afetando o físico. Segunda ela, muitos pacientes por conta desse fantasma que existe em torno da quimioterapia, acabam apresentando sintomas que são nada mais que frutos dessa ideia fixa de ter que passar mal, ficar com aparência de doente e assim por diante. O medo do desconhecido é muito presente e real a ponto de virar dor física.
Fora isso esta tudo sob controle, esta semana estamos fazendo alguns ajustes na casa. Arrumar meu quarto tirando ursinho de pelúcia, sapatos que ficavam no armário e qualquer coisa que possa causar alergias ou risco a contaminação.
Até o cachorro entrou na roda, vamos ter que tosar o Nick e ensinar a ele usar sapatos quando sair na rua para não trazer sujeiras. Começando o tratamento galera ta proibida de andar calçado em casa, e qualquer espirro vai ser motivos para usar mascaras.
Como podem ver é um cuidado absurdo que vou precisar ter, mas vai valer a pena! 

terça-feira, 31 de julho de 2012

Primeiras visitas....

A cirurgia estava programada para durar de três a cinco horas no máximo, durante todo esse tempo eu estaria no mais profundo sono e os meu queridos vivendo momentos de agonia.
Aconteceu que passamos das cinco horas, meu tumor estava grande e comprometeu mais que o esperado. Além da massa, foi retirado músculos, nervos e uma parte do pulmão esquerdo totalizando quase um kilo de massa. O que me custou um fôlego limitado e uma perda parcial de sensibilidade da mama esquerda. Confesso que isso ainda me incomoda muito.
Acabou que fiquei na mesa de cirurgia pouco mais de sete horas, quase oito. Piorando o nervoso dos meus pais e de muitos amigos que depois vieram me contar como foram as horas de espera. Eu, como previsível, não lembro de nada.
Mamãe disse que em um momento de desespero, sem noticias e passado a hora de eu sair do CC, meu pai tentou invadir o corredor que dá acesso as salas de cirurgia, a procura de qualquer noticia que pudesse tranquilizar todos que ligavam a procurando saber como estavam as coisas.
Sai do centro cirúrgico fui direto para UTI, passaria ali 3 noites por segurança. A cirurgia foi muito invasiva, fiquei extremamente debilitada. Além de tirar partes importantes, tive a caixa torácica serrada, sendo depois "costurada" com fios de aço, fazendo com que eu tenha dores de perder o sentido.
Hora da visita, na unidade intensiva do hospital se pode visitar os pacientes somente duas vezes ao dia, uma vez depois do almoço e outra vez de noite, algo assim.
A hora que comecei a despertar da anestesia foi um dos momentos mais nostálgicos que já vivi. Não lembro muito bem, estava sob o efeito de muitas drogas, mas foi uma sensação de felicidade plena. Lembro de fechar os olhos e agradecer a vida por estar ali, por te mais um chance. Eu nasci de novo. Senti uma lagrima escorrer, estava em fogos.
Passados alguns minutos acordo com a voz firme do meu pai já fazendo piada, minha mãe muito emocionada e em lagrimas me deu um beijo carinhoso na testa e um "Oi filha" que codificava todos os sentimentos do mundo, alivio, felicidade, preocupação ....
Como disse, minha memoria me trai por conta dos remédios, mas lembro de chamar por duas pessoas que são como pilares em minha vida, cada uma a seu modo, mas vitais para a minha caminhada: Amanda e o meu Anjo.
Adormeci mais uma vez, sonolenta que só eu ia e voltada. Perdi completamente a noção de hora. Até acordar com o calor das mãos do Anjo, quase não contive as lagrimas, ver o sorriso da minha parceira então... mais um turbilhão de emoções tomou conta de tudo ali.
Foi ai que eu me dei conta de uma coisa, eu sentia só o calor da mão dele, não o toque, a força. Eu havia perdido o movimento do braço direito....
Clichê, mas foi assim, meu mundo caiu ...


quarta-feira, 25 de julho de 2012

A cirurgia.

08/02/2012 - A noite anterior tinha sido conturbada, mas ainda sim vencida pelo cansaço. Acordei por volta das quatro da manhã, precisava estar no hospital as cinco para fazer check-in. Mala na mão, vamos lá. Deixei meu cachorro, o Nick, com um aperto muito grande, não sabia quando ia voltar, quando ia poder brincar com ele de novo... Talvez naquele momento, por alguns segundos, pensei que se tudo desse errado eu talvez nunca mais o veria, besteira. Respirei fundo e entrei no carro.
O caminho até o hospital foi calado, o rádio ligado parecia não incomodar ninguém, fazia um frio típico das manhã daquela estação e tinha uma neblina deixando tudo mais a flor da pele. Não me lembro das coisas que estava pensando, acho que me concentrei em admirar a paisagem, os últimos momentos de tranquilidade absoluta. 
Chegando no hospital foi tudo muito rápido, mal entrei e já fui para o quarto de observação, sempre acompanhada de minha mãe é claro, meu porto seguro.  Fiz alguns exames e passei com diferentes médicos,  tudo para não haver falhas. O pré-cirúrgico foi um sucesso, eu estava pronta.
A equipe que ia me operar se atrasou um pouco, passado das sete, o horário que estava programada a cirurgia, comecei a sentir um frio na barriga. A qualquer momento eu teria que largar as mãos quentes e seguras da minha mãe e encarar a faca sozinha, confesso que não estava segura de estar realmente pronta pra isso... Alias, quem estaria pronto? 
Quase oito horas, chega o meu transporte,o maqueiro muito simpático pediu que eu me deitasse que a sala estava pronta a minha espera. É agora ou nunca. Vamos a guerra! 
O corredor até a ala do centro cirúrgico parecia interminável. Já na porta do CC o gentil maqueiro pediu que eu me despedisse dos meus pais que dali em diante era restrito. 
Ainda não estava chorando mas um beijo doce e conturbado de esperança me fez desaguar. Meu pai com toda sua fé me olhou nos olhos ... 
- Vá com Deus, vai dá tudo certo. Estamos aqui esperando por você. 
- Eu te amo filha. Disse minha mãe com o mais sincero sorriso. 
Perdi o controle, ver as postas se fechando diante dos meus pais me fez vulnerável. Não poderia fazer isso sem eles por perto ... 
Com os olhos fechado fiz minha oração, horei pelos anjos que estariam ao auxilio daquela equipe e mais uma vez pedi ao Médico dos médicos que estivesse ali a minha espera. Que fosse operada primeiro pela minha fé, onde a cura era certa, para depois sentir o peso da minha condição humana. 
Meu francês estava lindo como sempre, exibia um sorriso que me deu muita segurança. Vendo meu estado me pediu calma... 
- Confie em mim, vai ficar tudo bem.
Respirei fundo e tratei logo de observar tudo que pude antes de adormecer, mas como não estava me contendo em lagrimas pedi logo que me apagasse. 
Até daqui algumas horas... 

terça-feira, 24 de julho de 2012

A última oraçao.

07/02/2012 - Finalmente, depois de tanto tempo de espera e muita angústia eu iria colocar um ponto final e virar a página. Horas antes da cirurgia oscilava de humor a cada segundo, se desse para medir como os batimentos cardíacos com certeza daria um belo humorgrama.
Minha cirurgia estava programa para as sete da manhã do dia seguinte com duração média de 3 a 5 horas. A incisão seria em formato de L , começando a três dedos para baixo do pescoço, como em uma cirurgia cardíaca, e continuando a esquerda, passando por de baixo da linha da mama. Fazendo um revolver com os dedos dá pra se ter uma noção do formato da cicatriz. 
Tive um dia tranquilo, tratei de ocupar minha cabeça com outras coisas, apesar de ter recebido muitas ligações e mensagens não me deixando esquecer que amanhã seria o grande dia. Se hora minha vontade era de sair correndo, de fugir, também tive momentos em que exibia a coragem e a determinação de um touro, como se nada pudesse me atingir. 
Tive medo, pânico, tudo ao mesmo tempo em que uma onda de pensamentos positivos me invadia, fazendo lembrar que aquilo seria para o meu bem, por mais cruel que parecesse. A essa altura do campeonato eu já havia restaurado toda a fé que eu tinha perdido com tanto desespero. 
No silêncio do meu quarto fiz uma última oração antes de dormir. Agaixada em sinal de respeito pedi ao Médico dos médicos que me operasse. Pedi perdão pela raiva que me tomou a fé, por ter negado a cruz que me foi dada. No intimo profetizei minha própria cura, jurei me fazer forte o suficiente para levantar daquele leito e me permitir capaz de dar este testemunho.
Assim se fez. 
A noite foi cruel. Estava perto o bastante da guerra para desistir. A vontade com que pedi minha benção abalou todas as minhas estruturas. Me senti fraca, como se toda coragem que alimentei durante dias tivesse desmoronado, estava em pedaços, levaria tempo para junta-los. Sempre fico vulneravel depois de entrar em comunhão com minha crença.
Não estava mais suportando o meu próprio silêncio, busquei aquele que carinhosamente chamo de Anjo. Me fez tranquila. Precisava de alguém para me lembrar que aquilo não é nada. Fiz deste o meu porto seguro, mal sabia que aquela seria o primeiro de muitos outros pedidos de socorro. O Anjo que me fora designado pelas própria mãos divina, é como o sinto. Um presente. 
Só mais uma fase, mentalizava,  como se a vida tivesse me dado uma segunda chance!  Fazer diferente, ser diferente, porquê não? Esquece, muito utópico. O medo ainda me tirava o ar.
Dez da noite toca o telefone. Não poderia ser para outra pessoa, mas para minha surpresa quem estava do outro lado da linha era um senhor que por genética chamo de pai. 
- Liguei porque sua mãe me pediu. Boa sorte amanha! 
Foi o suficiente para sentir o peso da armadura que eu acabara de vestir. Fui traída. 
Sempre tive a falsa ideia de que os pais são biologicamente programados para amar seus filhos, mas isso caiu por terra na mesmo momento que ouvi tão duras palavras. Meu próprio pai, um covarde. 
Chorei tudo que deveria e que poderia até adormecer por falta de força. 

segunda-feira, 23 de julho de 2012

Friends!

Bom, pelo que andei ouvindo tem uns loucos lendo isso aqui! Já vou advertir, cuidado para não surtar comigo!  Batidão é nervoso. Mas agradeço o carinho... Vou dar uma acelerada na historia, em duas semanas mais ou menos começo a quimioterapia, e quero escrever o dia a dia de como é tomar essa bandida.
Parei na doação. Passando isso aproveitei o ultimo final de semana do mês para curtir uma praia com uns velhos amigos. Não sabia quando eu ia poder ficar torrando no sol novamente, aquele efeito milanesa sabe? Sapeca de um lado e de outro, joga areia pra ficar crocante e vamos pro mar salgar a bunda. 
Um pouco mais sobre mim, sou viciada em seriados! Warner o tempo todo, e bom, de todas as series que tem por ai, de longe a minha favorita é Friends ... " i'll be ther for youuuu "
Nos tempos de colégio ficava analisando as amizades, tentando acertar quem eu levaria pra vida, se iriamos ser como eles. Me frustrei, do colégio só ficou os mais íntimos. Previsível. Mas no cursinho, aquele lugar sombrio que vai  sugar sua alma de tanto te fazer estudar e que no maximo vai lhe render uns colegas/concorretes que conheci a melhor turma do mundo, a quem dedico essa postagem.
No começo era meio complicado, conflito de interesses, uns estudando mais, outros menos. Mas com o tempo, entre um café e uma rodada de breja nasceu uma amizade incrível.
A praia foi maravilhosa, me distrai muito, boas risadas e muita historia pra contar. Quase virou caso de policia, nada serio. Por outro lado, ouvi muitas conversar sobre faculdade e o novo ano letivo. Ainda não tinha me dado conta que por hora eu seria o patinho feio, a única que não estava nem na faculdade e nem no cursinho. Fique mal com isso, e ainda fico. 
Caiu a ficha de que minha vida foi interrompida, e isso é uma angustia que vem e vai. Por mais lucida que você seja e madura o bastante para entender que aquilo não é o fim e sim uma pausa, fica um desconforto e isso não tem remédio. Alias tem sim, mais paciência. 
Alguns exames, doaçoes completadas com sucesso, vamos a cirurgia!

sábado, 21 de julho de 2012

Vamos doar sangue!

20/01/2012 - Depois de uma semana tentando diminuir o incêndio que se instaurou na minha vida voltei ao consultório do meu francês. Dessa vez falei e até sorri.
Assim que entramos na sala, eu e mamãe, comecei a reparar no meu Dr. , ele tinha um "x" a mais, o menino se criou no Rio. Formado veio para São Paulo fazer pós na USP, exibia o brasão da Escola de Medicina com muito orgulho, tinha a cara da riqueza.
Foi com essa minha curiosidade que começamos a nos aproximar, naquela consulta o francês malandro ganhou minha confiança. Tirei algumas duvidas, na verdade muitas, já que o nosso último encontro tinha sido um fiasco. Basicamente a consulta foi para colocar os pingos nos "is" e para nos orientar sobre a cirurgia.
Me pediu alguns exames, fez alguns encaminhamentos e a melhor parte de todas, me deu o dever de recrutar um certo número de doadores para o banco de sangue do hospital. Por ser uma cirurgia onde a perda de sangue pode vim a ser considerável, é protocolo sempre ter bolsas do mesmo tipo cosanguíneo do paciente disponível em caso de anemia.
Existe alguns bancos de sangue aqui em São Paulo, o hospital da Luz é abastecido pelo Hemocentro São Lucas. Na época, véspera de carnaval, o banco estava muito carente de doações, aproveitei para ajudar e fiz a minha parte. Eu precisa de três pessoas com o meu mesmo tipo consanguíneo, entre amigos e parentes arrastei pra lá mais ou menos 30 pessoas. 
Descobri que com esse numero eu poderia ajudar quatro vezes mais. Uma única doação pode ajudar a salvar até 4 vidas! Isso porque o sangue é separada em plaquetas, plasma, leucócitos e eritrócitos. Segundo as estatísticas 1 de cada 3 de nós necessitará transfusões ao longo de nossas vidas e que a cada 2 segundos alguém precisa de transfusão de sangue. Então já deixo a dica. Vamos doar sangue! 
E pra quem trabalha/estuda o atestado é valido pro dia todo, logo não tem desculpa! 


Campanha - Hemocentro São Lucas





quinta-feira, 19 de julho de 2012

Viva a moda lenço!

Aqui começa mais um período de espera e sobre tudo de muita paciência. Até fevereiro eu precisava dar um jeito de ocupar a cabeça e claro, não ficar doente. Que comece a bateria de exames.
Mas janeiro foi um mês que praticamente não passou. Os dias seguintes a consulta foi de muita dor. Recebi algumas mensagens me perguntando o que eu estava fazendo no facebook em Londres. Para muitos eu ainda estava Reino Unido a fora curtindo o melhor da vida. No começo preferi me preservar, não queria um mundo de gente me dizendo o que fazer ou como agir. Queria espaço, e muito.
Perdi noites de sono tentando entender ou simplesmente aceitar a minha condição. Como uma menina de 19 anos, com uma vida toda pela frente, não me julgando uma santa, mas não carrego tanto pecado assim pra merecer tamanho castigo. Devo ser uma péssima cristã ou fui uma moleca muito da levada.
Tanta coisa acontecendo ao mesmo tempo e só me vinha cobranças. Eu tinha que ser forte, ter paciência, ter pensamentos positivos, ter maturidade, esquecer a porcaria da vaidade e opção que é bom nada. Não tinha outro caminho, era assim e pronto.
Cheguei a comentar com uma velha irmã amiga que aquilo tudo não me serviria de nada! Dizem que tudo na vida tem um lado bom, que as experiências boas ou não são de alguma serventia, que se pode colher bons frutos mesmo nos pés mais desgastados. Eu não acreditava nisso, pelo contrario, na minha cabecinha de alfinete aquilo era puro castigo, nada mais.
Bom, isso que vou dizer agora para muitos é tolice. Dentre as minhas milhões de preocupações, uma delas falava mais alto, alias, bem alto! A vaidade. Todo mundo tem um registro predominante, ou é auditivo, ou é visual ou é cinestésico. Eu sou visual, logo saber que ficaria com uma cicatriz enorme no peito me tirava o sono, mas não é só isso. Mesmo não sendo um modelo de ternura e beleza sempre fui muito feliz com meu corpo, gosto de me cuidar, de me sentir bem! Imaginar aquele rastro me deixava mal, como se fosse um intruso no ninho. Ainda que ligasse o "to nem ai" sei que sair por ai com aquela marca despertaria muito curioso, e acredite, não foi diferente.
Usar biquíni, praia? Nunca mais, e quanto a isso ainda não mudei de ideia., mesmo ela estando bem discreta, ainda tenho vergonha. Viva a moda lenço!


quarta-feira, 18 de julho de 2012

O diagnóstico

13/01/2012 - Receio que esta postagem seja a mais delicada de todas. Receber este tipo de diagnóstico é quase tão duro quanto perder alguém. No instante em que se ouvi  as palavras maligno e câncer, uma parte de você se afoga em desespero. Como disse, é um suicídio fictício.
Para ser sincera, não me lembro com detalhes daquela consulta. Só sei que foram muitos intervalos, entre palavras de conforto e planejamento. Desejei do fundo do meu coração poder sair correndo, eu precisava de espaço, tempo e ar para voltar ao plumo.
Benoit tentou explicar da melhor forma possível, mas depois de confirmar que realmente era um timoma maligno, assim como suspeitara, não ouvi mais nada. Havia perdido o chão, os sentidos, tudo... Me sentia traída por aquele que se diz bom, a ovelha fora do rebanho.
Na cadeira ao lado, mais uma vez, minha mãe por mais armada que estivesse também não conteve a dor do fardo que acabamos de receber. Não tenho filhos, mas acredito que não deve ser nada fácil para uma mãe ter um filho nessa condição. Pra quem se já se desesperou com um choro de cólica, imagina como não reage diante de um câncer...
Lembro-me de ouvir algo sobre radioterapia, quimioterapia e principalmente sobre cirurgia.  Dessa eu não escaparia. Já tratamos logo da parte burocrática e a agendamos para o mês seguinte. 
Agradeci a atenção e recebi um abraço de coragem. Voltaria na semana seguinte.
Corredor a fora, no momento que chegamos ao elevador comecei a dar sinal de choro, mas não poderia fazê-lo ali. Em publico não. Esperei chegar ao nosso bom e velho café.
Mais uma vez me retirei da mesa, não tinha assunto. Até mesmo meu pai, o cara das palavras de conforto estava calado. Fui chorar...
Amparada pela parede, me vi totalmente descontrolada em lagrimas. Sentia uma raiva que nem mesmo quebrar pratos resolveria, e uma tristeza que até fez o tempo fechar. Não tinha onde me apoiar, colo nenhum resolveria, e qualquer palavra de conforto doía como estacas cravadas no peito. Chorei a ponto de perder os sentidos, de prender a respiração, até cair sentada de tão tremula.
De cabeça baixa e totalmente desiludida senti as mãos quentes de minha mãe, limpou as minhas lagrimas e me levantou como quem dá a mão a um ferido em batalha. Fiz de suas pernas as minhas.
Fomos pra casa...

segunda-feira, 16 de julho de 2012

inFeliz ano novo!

Mala feita, caminho da roça. 
A viagem é longa, mas nada de pressa, vamos parando em tudo que é posto. Aquele balanço todo me torturava, por precaução fui no banco da frente, o mais confortável possível. Sinceramente minha vontade de pegar a estrada estava quase negativa. 
Só teria o resultado da biopsia dia 10, até lá não importa onde eu estivesse, nem com quem, eu ia ficar pensando nisso. E bem, aos 19 anos já tinha vivido muita coisa, aquela historia de minha vida daria um livro é bobagem, a minha estava mais pra trilogia. 
Aprendi que quando se espera o pior, e o pior acontece, sofremos menos. Não que eu não sigo os adeptos do pensamento positivo, acho isso muito valido e real, mas naquele momento eu me armei para o pior, tenho tendência a sofrer por antecipação. 
A ideia da viagem foi pra ver se o tempo passava mais rápido, pra eu me distrair. Que tolice! Não sabe que tudo que é bucólico se perde no tempo? Ou talvez seja a correria da cidade cinza que distorce tudo... Não sei! Não importava, minha cabeça estava ocupada traçando todas as possibilidade que tinha pela frente, mais ou menos como joguinho de ligue os pontos. 
Ter sua vida determinada por um exame é frustrante. Quase sempre tive controle das coisas, ao menos tinha opçoes. Dessa vez não.  
Noite de ano novo, todo mundo se arrumando, fomos a cidade ver os fogos. Sai do banho e fui pro quarto me aprontar. Minha mãe me comprou um vestido branco, de rendas, ficou perfeito! Se não fosse por um detalhe, eu não tinha o que celebrar! 
Sentada ainda de toalha passou um filme na minha cabeça, 2011 foi um ano muito bom, mas o que estava por vim eu não tinha ideia de como seria. Se estava começando assim, coisa boa eu não podia esperar. Estava me sentindo péssima, sentia as lagrimas molhando ainda mais minha toalha quando minha mãe entrou no quarto me apressando. Não tinha a mínima vontade de levantar. Aos mesmo tempo que me sentia culpada por causar aquela situação na véspera de ano novo, não tinha força nem mesmo pra fingir um sorriso. Ouvi muitos votos de fé, mas não sabia onde buscar. 
Perdizes tem uma estatua do Cristo, era de lá que vinhas os fogos. Onde passei minha infância, todo ano tinha o campeonato de fogos de artificio, jogos de luzes desaparecendo no ar sempre tem um gostinho especial. 
Contagem regressiva, um último fôlego pro ano que se encerra e vamos aos abraços. 
Aqueles dias em Minas foi bom, apesar de não ter me aliviado em nada.